domingo

Nas Entranhas...



Tinha muita idade
quando aprendeu a ler...

Soletrando devagar,
silabando sem pressa,
sibilando nas singulares
curvas plurais,...
de repente,
destravou a tramela.

Descobrindo,
descobriu-se.
Fez-se portas, janelas,
sol, lua estrelas...

Finalmente, lia!?...

Tudo que agora
parecia mais fácil,
em verdade,
era tão difícil...

Por que às vezes
o que estava escrito
não era o que estava escrito?

Ler era tão bom
que até lhe fazia mal!?

Aos poucos,
bem devagarzinho,
foi entendendo que ler
era feito um caminho
cheio de trilhas, picadas,
desvios...
Como os tantos que ele abrira
quando suas mãos
ao invés de livros
seguravam a enxada.

Ler era mais,...
muito mais
do que imaginara...

Palavras
dentro de palavras;
palavras
entre palavras;
palavras
aninhadas em linhas
e entrelinhas.
Palavras que não se via!
Mas, lá estavam.

Feito mato mal capinado...
Parece estar morto.
mas, ainda enraizado,
rebrota, viçoso, forte,
do chão molhado.

Palavras se pareciam
com tanta gente que conhecia.
Se houvesse aprendido antes...

Inquietava-se...
Para ler como gostaria
seria preciso ler,
e ler,
e ler...
Até o infinito.
Sua curiosidade tão grande
não caberia no fiapo de vida
que lhe restava.

Talvez,
nem na eternidade...

ju rigoni (1988)


Foto obtida via net.


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