domingo

Inversos




O pensamento
irriga-se...
Diante de tanta desolação,
ondeia;
inunda em águas
inúteis, salgadas,
o canto dos olhos...

E elas caem
sobre o papel
como mísseis
em meio a uma guerra...

Borram letras,
mutilam palavras,
destroem, na essência,
a justeza do pensamento.

Colocam o poeta
no front
da própria impotência...
Na seca
ou na inundação,
as palavras que salvariam
nunca seriam as suas...
Ainda que atingissem o alvo...

Sem o poder do poder,
o poeta desfolha-se...
Rasga o papel
do poema sem papel...

E afoga-se...
nas águas
da mágoa infinda...
Alivia a seca
que insiste em apoderar-se
da sua poesia...

ju rigoni (1980)

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3 comentários:

Marcantonio disse...

Muito bom! Lembrei do "Não há vagas" do Ferreira Gullar: "Só cabe no poema/o homem sem estômago/a mulher de nuvens/a fruta sem preço//O poema, senhores/não fede/nem cheira".

Abraço!

Anônimo disse...

Uau! Poema de irrigar; no papel não mais se escreve, instumescido de tanto poiésis.

Denise disse...

Aprendi que um poema não se comenta, então registro sentimentos diante da maravilhosa maneira que vi as lágrimas ganharem vida - uma inundação de emoção!!
Belo. Profundo. Amei!

Como dosse lá no Tecendo, foi quando vi tua carinha rindo pra mim que avaliei a falta que esse rosto sereno faz. Adorei a visita!
Bjo carinhoso. Inté +, querida!