domingo

Ingenuidade Santa




Já no mei do caminho,
vencido num par-de-arara,
paramo pra vê um rio
i nem mermo acreditamo...

Lá adondi nóis morava
os rio era tudo seco,
i nóis andava um montão
pra mó de ponhá u zóio
numa titica de água.

Fiquemo inté muntio tonto
de tanto e tanto oiá
as água do rio passano, passano,
tan mansim, quasin silêncio,
i o nosso estômbo
roncano, roncano,...
fazeno coro cum o ventu
i os eco do pensamento.

Murmuro,
murmuro,
murmuro...
Lá ia o rio passano...
E nóis tudo ali,
oiano...

Murmuro,
murmuro,
murmuro...

As água era só murmuro,
carinhano os pedregúio,
cantano canção prus peixe,
que ia nadano, nadano
pra longe de onde nóis tava, -
qui inté dava de espantá
o tanto que o estômbo roncava...

E quano chegamo a cidade
nóis era fome, cansaço,
e muntia dimiração...

Lá pro finá da tardinha,
subimo num morro aarto,
todo cheim de casinha,
pra mó de arrumá um canto
qui nóis pudesse pagá.

Um hômi muntio bãozinho
deu lugá pra nóis ficá,
mar disse que os menino
ia tê que trabaiá.

Ficamo tudo encantado, -
nem bem chegamo a cidade
já tinha amigo, posada,
i arguém já'rrumô trabaio!?...

Adispois de dois mês
nóis já tinha fogão,
cama, cadêra,
mesa, sofá, geladêra...
Fartava a televisaum!

Mar os minino já disse
que na semana que vem
nóis já vai tê a telinha, -
vai podê vê os pograma
que passa no tar cineminha.

Mar eles vai inscoiê
aquilo que nóis pode vê,
pruque ficarum sabeno
que tem uns tar de jorná
quinventa é muntia coisa...
Parece arte do demo!

Os minino vende uns pó
e uns fuminho que feeede...
Mar do que fumo de corda!
Trabaium de dia, de noite,
pra eles nunca tem hora...

E as minina sai de noite
- tan arrumadinha! -
pra vortá de manhãzinha
cum cara de transantônti.

Nossas fía inté parece
moças rica de revista, -
que aquele amigo bãozinho
deu prelas sapato, rôpa,
água de xêro, batão...

Mas a muié num conforma, -
qué que elas fica pur perto.
E os minino, tan esperto,
num cansa de expricá:
- Mainha, a cidade é grande!
Acá tudé diferente...

As criança é inteligente!

O fio mais véi é tão bão
qui num qué qui nóis trabaia, -
eu e a muié tamo a-tôa,
vida mar melhó de boa!...
Nóis só sai pra inhí nas missa,
que nosso sinhô merece
todas prece qui nóis sabe.

Mar hoje quano vortemo
os vizinho vinherum dizê
que os puliça veio aqui
pra perguntá dos minino...

E nóis nem se aperreô...
Pode vir quano quisé!
Pode sim. Pode vortá!
Quissé casa de famía!
Acá num tem cabra safado, -
c´as graça de nosso sinhô
só mora trabaiadô!...

ju rigoni (Sem registro de data)


Visite também
Fundo de Mim, Medo de Avião, Navegando...

2 comentários:

Zélia Guardiano disse...

JU!!!!!!
Que trabalho lindo, incrivel, maravilhoso!
Parabéns, grande poetisa!
Fiquei muito comovida...
Grata por este lindo momento de leitura!!!
Abraço, querida!

Eloah Borda disse...

Pois é, minha amiga, agora sou eu que digo: - não sei se rio ou se choro... Essa "ingenuidade", essa desinformação, esse distanciamento da realidade, está por aí, em toda a parte... e são pessoas assim que elegem os nossos governantes... Daí estar como está...
Parabéns! Sempre certeira!
Beijinsss.